ENTREVISTA: MC Lipi e MC Hariel falam sobre ‘Bem Melhor’ e a importância do funk no Brasil

 O novo single chega acompanhado de um videoclipe mega produzido


Em uma das parcerias mais aguardadas do funk, MC Lipi e MC Hariel unem forças no novo single ‘Bem Melhor’, lançado nessa sexta-feira, dia 18. A nova música, marcada pelo beat trap, fala sobre superar críticas, dificuldades e adversidades ao longo da caminhada até o sucesso.

Engajados nas questões sociais que envolvem o funk e todo o seu movimento cultural, os artistas estendem seus trabalhos para além da música, que através das letras, é capaz de desenvolver mudanças profundas entre jovens e crianças da periferia. Reconhecendo a magnitude do trabalho realizado por eles, Lipi é hoje um dos líderes da corrente ‘Funk Consciente’, enquanto Hariel também não deixa de se posicionar politicamente.

Agora, a parceria chega acompanhada de um videoclipe super produzido e repleto de paralelos entre os lugares de onde eles vieram até o sucesso que alcançaram.

Em conversa com o Periódico, MC Lipe e MC Hariel compartilharam mais detalhes sobre o processo de produção de ‘Bem Melhor’ e falaram um pouco mais sobre a influência do funk nos mais diversos lugares do Brasil.

 

Entrevista

‘Bem Melhor’ fala sobre a trajetória de vocês até o sucesso. Como foi essa caminhada para vocês?

Lipi: Pra mim, foi bem difícil. Graças a deus hoje podemos ser reconhecidos através do nosso som e do nosso sonho. E, mano, eu sonhei demais para estar onde eu estou hoje. Passei por muitas frustações e ansiedade até chegar aonde estou hoje. Então para mim é muito importante estar aqui e saber tudo que passei. Valorizar o tanto que foi difícil ajuda a entender o valor de estar aqui hoje. A caminhada foi longa demais, tenho 7 anos de carreira, mas valeu muito a pena.

Hariel: Pra mim também não foi muito diferente. Muita adversidade, vontade combinada com ansiedade e muita coisa que mexe com a mente da gente. Até perda de amigos e família, que abalam muito a mente. A gente fica cada vez mais ansioso para dar orgulho pra quem fica, pra minha mãe e meus amigos que ainda estão aqui. Tem muitas coisas que a gente não entende que é só uma fase. Às vezes parece um pesadelo e que vai tudo por água abaixo, mas depois que passa, a gente percebe que isso é necessário. Sem isso não tem música nem originalidade. Coisas difíceis acontecem, mas elas fortalecem e hoje sou exemplo para muitos jovens.


No Brasil, o funk ainda é alvo de muita crítica e preconceito. Como vocês lidam com isso?

Hariel: Eu acho essa rapaziada muito mesquinha e pequena. Se eu vejo que a pessoa está fazendo uma crítica baseada em coisas sinceras e em estudos sobre o funk, tudo bem. Mas se não, eu nem ligo. Tem muita música de outros ritmos que fala de coisas piores, as vezes indiretamente ou diretamente, mas só por não ter sido produzida por um DJ de funk, passa batido. Eu vejo isso muito como estrutural do Brasil mesmo, oprimir o mais fraco, porque se a pessoa é mais forte você não vai querer sair na mão com ela. Acho que isso, comparado com os elogios e a galera que gosta da gente, é muito desproporcional, então nem ligo.

Lipi: Eu digo o mesmo. Como Hariel falou, essas são pessoas pequenas que têm a mente fechada. Crítica tem em todo lugar. Existem livros bons e ruins e é o mesmo com a música, não só no funk, mas em vários gêneros. Se as críticas forem baseadas em algo sincero e vem de uma pessoa que estudou o funk, como o Hariel disse, é legal absorver. Agora, pessoas que estão ali só para falar, são pessoas que não enxergam o que estamos passando. Muitas pessoas já mudaram de vida devido as letras boas ou saíram do crime por ouvir uma música da hora. 

Ainda sobre ‘Bem Melhor’, como surgiu essa parceria entre vocês?

Lipi: Foi o mais natural que tinha pra ser. Eu acompanho o Hari desde pivete, várias músicas antigas dele eu já acompanhava, ele tem uma trajetória maior que a minha e eu sempre fui fã. Aí, quando tivemos oportunidade de trocar uma ideia, interagimos pelo Instagram mesmo, foi aquela parada bem natural mesmo, que era pra ser. Pelo WhatsApp eu disse que tinha muita vontade de fazer um som com ele, e ele me disse que também queria trabalhar comigo e isso para mim foi muito gratificante, sem palavras!

Hariel: Pra mim foi da mesma forma também! A gente foi trocando mensagem e a música saiu como tinha que sair mesmo, natural. Colamos no estúdio duas vezes e já saímos com a música pronta. E já fizemos outra também que ainda não saiu, fala aí, Lipi. Mas está lá, tá pra sair.

 

Então vocês já têm planos de lançar outras parcerias no futuro?

Hariel: Claro! Eu sou fã do Lipi, ele é um moleque muito chapa quente. O trabalho dele tem muito a ver com continuidade no funk. Não tem que ter espaço só pra um ou pra outro, tem que ser todo mundo bombando.

 

O videoclipe da música é bem diferente do que estamos acostumados a ver nas produções de funk. Todo o conceito foi pensado por vocês?

Lipi: Eu sempre sonho com uma parada legal para as minhas músicas, fazer uma estrutura merecida para a música, mas as vezes não acontece dessa forma. Essa música com o Hari, eu conversei com a minha equipe e falei que era um sonho que eu estava realizando e queria uma estrutura legal, que o funk não tá acostumado a ver. Eu sou muito fã dos caras da gringa e penso que a gente conquista tanta coisa, então podemos fazer as coisas que eles fazem, como usar uma estrutura da hora no funk e mostrar que a gente também consegue. Foram algumas ideias minhas e algumas do Hari e foi isso. Estamos trazendo a estrutura que o funk merece.

Hariel: É o que o funk merece, mas não está acostumado a ver. A gente espera que seja uma virada de chave mesmo. Eu quando vi esse clipe pronto fiquei até assustado de tão bom. É uma oportunidade de expandir nossa arte e mostrar que o que a gente faz tem valor.

 

Para vocês, qual é a importância do funk para as crianças e jovens da favela?

Hariel: Eu acho que o funk é um professor sem jaleco e giz, porque ele ensina ou da pior ou da melhor maneira, dependendo de como você age e do que tem dentro do seu peito. Ele é um ritmo diferente que chega a ser um movimento porque ele vai aonde ninguém está disposto a ir. Ele entra em todos os lugares do Brasil, desde o mais perigoso e, hoje em dia até os de padrão mais alto. Dependendo da letra, ela pode trazer o moleque para o lado bom, fazer ele refletir. Isso que o funk faz, não adianta as pessoas criticarem se nunca fizeram parecido. Nenhum projeto é tão consistente há tantos anos dentro da comunidade em mostrar um caminho para os jovens. Poucas pessoas têm esse olhar de dar uma oportunidade para um menino da favela, mas o funk faz isso e também é um ritmo muito acessível. Tem pessoa ruim em todo lugar, seja música, igreja ou qualquer lugar que você for. Então, não dá para julgar todo um movimento por atitudes de uma pessoa.

Lipi: Eu, que vim de periferia, tinha muitas chances de entrar para o crime, ver só o caminho ruim, mas eu escolhi o funk. Pude realizar sonhos da minha mãe, do meu pai e os meus sonhos também. Pra mim, foi uma saída, eu vejo como uma salvação.